Na cozinha com os candidatos à reitoria da UTFPR

Após uma leitura mais apurada acerca do debate dos elegíveis, percebe-se um alinhamento muito claro das propostas individuais.

Sugiro a todos os leitores realizarem um análise minuciosa na esperança de encontrar um projeto válido de Universidade doravante participativa, em que se possa votar.

Sugiro aos candidatos uma análise menos pretensiosa dos 'discursos líquidos' ali proferidos.

Neste emaranhado de desarranjos no domínio das condutas, que segue o processo de consulta da comunidade acadêmica, a ética e a lei confundem-se em grau e substância, transpassam o valor histórico a elas atribuído.

Há candidatos, que a primar pela lei, corrompem o dever ético de proteção dos mais frágeis, e na contramão, ao primar pela ética acreditam estarem acima da norma máxima de condução das coisas na esfera pública.

Do pâncreas ao cosmos, diria Sócrates, assistindo tamanha higienização da moralidade entre um candidato e outro: 'Voltem para o homem.'

Disse um deles, sem perceber que ainda falava ao microfone: "Ela me odeia".

O conflito socrático com os sofistas acusava um estudo muito valorado do cosmos, e deixava de lado os planos mais conflitantes e latentes do ser humano. Sócrates numa tentativa humanista de aliar o exercício da dialética com as coisas mais cercanas do ser, pediu que a época parasse de vislumbrar o cosmos, e de perder de vista a condição sine qua non da polis, a vida.

Há projeto em que o candidato propõem a condução lean manufacturing da coisa pública. As palavras de ordem são o uso "otimizado", "enxuto" e em tempo record dos processos estudantis e do funcionalismo, nem que para isso tenha que causar "trabalho excessivo". O candidato mata o gavião e deixa crescer a jararaca.

Na mesma proposta pode-se enviar um macaco à Lua, mas nada é dito a despeito dos desdobramentos da sociedade industrial e como ela afeta diretamente os jovens que trabalham, pesquisam e nem sempre encontram um espaço de valoração e respeito na universidade.

Aliás, alguém ouviu a promessa de ar-condicionado para os estudantes? Confesso que é risível.

Para a chapa de "situação", indicadores, estatísticas, tabloides e revistas magazine se aliam aos positivistas franceses do início do século XIX, onde a verdade era um desdobramento das ciências naturais e, portanto, denominava-se verdade científica. As decisões positivistas baseavam-se quase que exclusivamente nas leis físico-matemáticas.

Todas as propostas alinham-se com um projeto de enviar o problema para o exterior, na promessa de uma "classe mundial". Dar aulas em inglês para ocultar a deficiência de espaço e da infra-estrutura dos cursos de língua estrangeira.

Me efunde pavor, falar "rumo à classe mundial", talvez porque me lembre a obra magna de George Orwell (Eric Blair), 1984. O Grande Irmão engana e multiplica por meio do controle da vida privada a ideia de que existe uma globalização regional em curso, acima da vontade e das necessidades básicas dos cidadãos de uma das três grandes nações: Lestásia, Eurásia e Oceania.

Estamos no mundo, mas não somos a totalidade do mundo, e, portanto, é regra entender que as necessidades fundamentais do estudante são realizações de um projeto muito mais próximo da comunidade, e muito mais longe de colocar o problema para estudar no MIT.

"É uma visão um tanto reducionista", disse a candidata alvejada por ter algum elo com o Sindicato. Não transgride as normas no domínio das condutas ser sindicalista, pelo contrário, mostra a capacidade do candidato de interpretação das vontades da sociedade civil organizada, meio pelo qual se estabelecem as relações do ensino, da pesquisa e da extensão, no domínio da práxis.

A candidata respondeu à altura. Foi uma taça de vinho ao estilo Kátia Abreu na cara do José Serra de plantão.

O debate parecia uma entrevista para o doutorado, nunca ouvi uma declaração de amor tão bonita ao currículo Lattes. Particularmente, apesar de manter o meu atualizado, não penso que o subjetivo de um indivíduo tenha espaço na plataforma Lattes, e, desta forma, não é um argumento convincente para qualificar um elegível.

Dentre tantas hilaridades e algumas respostas esclarecedoras, podemos abandonar o modelo de capitania hereditária, mas corremos o sério risco de uma gestão da tecnocracia, um projeto que tombou com a ditadura militar e azedou as negociações na USP.

"Não moro em casa de cômodo / Não é por ter medo não / Na cozinha muita gente / Sempre dá em alteração." Os ânimos se elevaram na batucada da copa quando o mais tímido dos quatro meninos tocou nos editais dos 'Assuntos Estudantis'. "O processo é burocrático, é precário... A professora falou que hoje não tem lista de espera, hoje todos esperam". A gritaria foi geral. Volmir entrou para o pantheon da mitologia grega.

Um outro debate ocorre nos bastidores e alguns assuntos serão tratados na cozinha das eleições.

Ainda espero um posicionamento mais adequado dos candidatos sobre: o cumprimento das dez ações do Programa Nacional de Assistência Estudantil, previstas no Art. 3º parágrafo primeiro, do Decreto nº 7.234; da construção participativa prevista no Art. 4º; como se dará a articulação da transparência, lisura e distribuição dos recursos estudantis; o estudo de redução da carga-horária dos cursos de graduação, considerados os mais exaustivos do Brasil; e a articulação de uma Comissão de Direitos Humanos para a denúncia e enfrentamento aos casos de misoginia, racismo, repressão e exaltação ao ódio, em um tempo de convulsão social.

Não poderia faltar, para fechar a noite, o ti ti ti de Rita Lee.

"Volta e meia, meia volta volver / Saio de fino para ninguém perceber"

Com esta trilha sonora, a candidata da chapa de situação saiu pela porta dos fundos e se negou a posar para uma fotografia com os estudantes. Em verdade, "nada mais furado do que papo de tiete."